Winston Churchill e a educação clássica versus a educação moderna

Artigos pedagógicos
Leitura em
5
min
Publicado em
14
/
08/2020
Autor
Fabrício Garcia
CEO na Plataforma Qstione
Fabrício Garcia é um professor da área de saúde apaixonado pelas novas tecnologias educacionais. Seu foco principal de trabalho está em ajudar instituições de ensino e professores a implementar novas tecnologias que aumentem a eficiência educacional, justamente por acreditar que a tecnologia é o caminho mais simples para democratizar a educação de qualidade no Brasil.
Receba nossas novidades
Ao assinar você concorda com nossa Política de Privacidade.
Cadastro recebido com sucesso!
Oops! Algo deu errado.
Compartilhe

Costumo pensar em educação diariamente. É a minha vida, o meu trabalho. Por isso, algumas perguntas sempre permeiam a minha mente: As crianças do século 21 são mais inteligentes do que as do século 20? A educação moderna é melhor que a educação clássica? Precisamos realmente mudar as estratégias de ensino a todo momento?

Tais questionamentos fazem parte de um escopo de reflexões que potencializam a minha paixão pela educação, motivando-me a estudá-la sob uma ótica mais holística. Assim, devido ao desejo de entender a educação moderna, sair da superfície das estratégias de ensino e de compreender os resultados educacionais brasileiros, sinto uma necessidade premente de estudar as origens da nossa educação.

Neste intuito, um dos temas educacionais mais fascinantes e recorrentes em meus estudos é o embate entre o paradigma da educação moderna e da educação clássica. A partir desse tema, comecei a repensar alguns conceitos que me foram apresentados durante minha trajetória acadêmica, sob a influência das correntes de pensamento que apoiam fortemente a educação moderna e dominam o cenário educacional brasileiro. Consequentemente, a minha visão sobre a educação moderna se tornou um pouco mais crítica. Especialmente porque compreendi que esta educação é resultante de uma grande desconstrução do mundo clássico. Mas, falaremos sobre isso mais adiante.

Por agora, lembrei-me de uma pessoa do meu convívio, que tem dois filhos em idade escolar, e me disse: “a educação precisa se modernizar, pois as crianças de hoje são muito diferentes das crianças de antigamente”. Eu já tinha ouvido esse tipo de comentário. Só que partindo de professores e de outras pessoas não tão próximas. Também já tinha lido muitos artigos de especialistas em educação que sugerem a mesma linha de raciocínio. Mas, dessa vez, ao ouvir tal comentário, fiquei mais reflexivo. Provavelmente, o fato de o comentário ter partido de uma pessoa que faz parte do meu círculo familiar me fez perceber uma realidade inescapável, na qual a mudança da cultura educacional atingiu as famílias e não apenas a academia. Por este motivo, finalmente, resolvi escrever um artigo sobre esse tema.

Panorama da educação moderna

Atualmente, no Brasil e em muitos outros países ocidentais, a educação moderna é considerada o único caminho a ser seguido pelas instituições de ensino e pelas famílias. É como se a educação clássica e seus valores, sedimentados por séculos de cultura ocidental, estivessem 100% obsoletos. Assim, de uma hora para outra, milênios de aprendizado obtido por meio da educação clássica passaram a ser renegados no mundo contemporâneo.

É nesse cenário de hegemonia de pensamento que a educação moderna floresce, sem contrapontos e com resultados duvidosos. É um contexto muito estranho em se tratando de educação, uma vez que os processos educacionais deveriam ser caracterizados pela discussão contínua, necessidade de autoavaliação e constante evolução. Sendo assim, os discursos hegemônicos não fazem sentido no contexto educacional.

De toda forma, pensando nessa discussão, resolvi traçar um paralelo entre a educação clássica e a educação moderna, utilizando como base a história de um grande personagem do século 20, Winston Churchill. O meu objetivo principal é iniciar o leitor no maravilhoso mundo da educação clássica, instigando-o a repensar os modelos educacionais da atualidade.

Mas, antes disso, é importante frisar que Churchill vivenciou um período de transição entre a educação clássica e a educação moderna. Portanto, em meu ponto de vista, a educação recebida por Churchill foi fortemente influenciada por valores da educação clássica. Porém, a visão da educação moderna já permeava a sociedade da época. Assim sendo, pode-se afirmar, em certa medida, que Churchill viveu um período educacional híbrido.

Por que usar Churchill como referência da educação clássica?

Um dos livros mais marcantes que já li foi a biografia intitulada Winston Churchill: Uma vida, escrita por Martin Gilbert. Para os amantes da educação, o primeiro volume dessa biografia é imperdível. O autor perpassa pela infância de Churchill e detalha a história educacional desse homem, que foi um dos maiores políticos do século 20, além de escritor e detentor de diversas habilidades, das quais algumas são pouco conhecidas do público em geral.

Por que utilizar a educação de Churchill como um contraponto à educação moderna? A resposta é simples! Winston Churchill, quando criança, não era um gênio. Muito pelo contrário. Ele era uma criança cheia de problemas e, em alguns momentos, considerada desajeitada e displicente, além de apresentar um desempenho mediano durante a maior parte da vida escolar. Mesmo assim, ele conseguiu se tornar um dos homens mais influentes da sua época, um escritor e orador excepcional, com extrema habilidade política; além de atuar em várias áreas diferentes, com muita competência. Tudo isso, após receber grandes doses da educação clássica.

A vida de Churchill, por conseguinte, será o “pano de fundo” para falarmos sobre a educação clássica neste artigo.

Conceitos fundamentais

A educação clássica (ou artes liberais) foi um método de ensino utilizado por quase 2500 anos, e esteve presente no sistema educacional de gregos, cristãos e romanos. Nesse período, a humanidade passou por grande evolução em praticamente todas as áreas (artes, ciências, escrita, matemática, filosofia, etc.). Mas, a partir do século XVII, o ensino clássico entrou em declínio, e um novo paradigma educacional começou a surgir: a educação moderna.

Apesar da sua chegada, ainda hoje, na educação contemporânea, os preceitos da educação clássica são utilizados, mesmo que de forma restrita e adaptada. Nos Estados Unidos e Canadá, por exemplo, os bacharelados interdisciplinares (Exemplo: Bachelor of Arts e Bachelor of Science nos EUA) ainda seguem um esquema curricular adaptado da educação clássica.

Na prática, a educação moderna ainda é uma “criança”, já que, apesar de se iniciar no século XVII, continuou a existir e a influenciar fortemente a educação do ocidente, até meados do século XX. Assim, arrisco dizer, que não temos nem um século de predominância da educação moderna no mundo ocidental. Mas os resultados iniciais obtidos pela educação moderna não são bons. A educação brasileira é um bom exemplo disso. Por isso, sou um grande crítico do modelo educacional vigente.

Todavia, antes de qualquer coisa, precisamos delinear quais são as bases da educação clássica e da educação moderna. Ressalto que este texto não objetiva explicar detalhadamente os preceitos de ambas. Para isso, no final do artigo, você encontrará uma lista de referências literárias destinadas aos que desejarem se debruçar sobre a temática.

Meu ponto será apenas comentar sobre alguns tópicos divergentes entre a educação clássica e a educação moderna. Dessa forma, os leitores com pouco domínio sobre o tema poderão, tranquilamente, acompanhar a minha linha de raciocínio e formar um juízo de valor sobre os argumentos apresentados.

Diferenças entre a educação clássica e a educação moderna

Para delinear as principais diferenças entre a educação clássica e a educação moderna, vou evocar um pequeno livro de 1944, intitulado A Abolição do Homem, cujo autor foi um dos mais brilhantes pensadores do século XX, o renomado erudito de Oxford e de Cambridge, Clave Staples Lewis. Em menos de 100 páginas, C. S. Lewis, na minha opinião, faz a análise educacional mais importante do século. Ele descreve o que seria o início da mudança do paradigma educacional, a partir da leitura de um texto extraído de um material escolar da época, nomeado por ele como: O Livro Verde.

Isso mesmo! Já naquela época, havia a preocupação quanto a qualidade dos materiais didáticos, bem como quanto ao nível de ideologização presente nesses materiais.

Em seu livro, Lewis explica duas concepções de mundo diferentes que podemos chamar de “era moral versus a era moderna” e “era sapiente versus a era científica” (Fonte: Educação Clássica vs. Educação Moderna, de Steve Turley). Segundo Steve Turley, um grande estudioso da educação cristã e PhD pela universidade inglesa de Durham, Lewis define essas duas eras da seguinte maneira:

Para o homem clássico, a pergunta fundamental era: “Como posso conformar minha alma com o mundo que me rodeia de modo a ser elevado à vida divina”? E a resposta era: “Por meio  da oração, da virtude e do conhecimento.

Já para o homem moderno, a pergunta era invertida, pois ele não está interessado em adaptar sua alma à realidade. Assim, o homem moderno pergunta: “Como posso conformar o mundo com meus próprios desejos e ambições?”. Infelizmente, a resposta está relacionada à exploração dos mecanismos de poder que permeiam a sociedade, como: o Estado, as instituições científicas, a tecnologia e o saber.

São duas visões completamente distintas da realidade, implicando em modelos educacionais que se contrapõem. Basicamente, o homem da era moral buscava as virtudes, o saber e a evolução espiritual. Portanto, a educação clássica era baseada nas busca por esses valores, com o intuito de preparar o indivíduo para posteridade, tornando-o um ser verdadeiramente humano e com capacidade de contribuir para uma sociedade mais justa. Como dizia Lewis, o objetivo da educação clássica é produzir “homens de peito” (homens de virtudes).

Surgimento da educação moderna

Segundo Lewis, a educação moderna surgiu com a ruptura da cristandade no século XVII. Portanto, não foi algo que aconteceu de forma repentina. Naquela época, o conhecimento começou a ser considerado algo limitado ao cientificismo. Isto é, o conhecimento ficou restrito ao que se pode verificar por meio de um método ou pela aplicação da ciência. Nesse intuito, tudo que não fosse passível de verificação por um método ou explicado por uma razão científica, não era considerado um saber, um conhecimento ou uma verdade; sendo tratado apenas como algo relativo às percepções pessoais.

Esse relativismo quanto aos valores não cientificistas mudou a nossa concepção de cultura, que ficou mais arraigada a um sentido científico-social. A ausência do transcendental, do espiritual, das crenças e da fé, determinou uma relativização perigosa do termo cultura; já que os valores morais influenciados pelo transcendental, como a beleza, a bondade e a verdade deixaram de ser princípios reais. Tais valores, para o homem moderno, passaram a ser coisas que variam de acordo com as próprias vontades e percepções individuais. Assim sendo, os valores que eram concretos na educação clássica, tornam-se abstratos na educação moderna.

Nesse contexto de relativismo moral, a cultura perde o sentido de ser, já que o seu papel principal é dar significado ao mundo. A cultura é justamente um conjunto de práticas, costumes e símbolos, por meio dos quais um povo compartilha e impõe significado a um mundo sem significado. Sem ela, um povo perde a sua identidade e a educação fica perdida em um mar de princípios constantemente desconstruídos pelo individualismo do homem moderno.

De acordo com Steve Turley, para Lewis, a educação moderna visa a enculturação contínua, criando uma falsa dicotomia entre a ciência e a religião, o fato e a fé, o conhecimento e a crença. A ideia é afastar os estudantes da piedade cósmica e da busca pelos valores transcendentais; pois, para educação moderna, o Belo, a Verdade e o Bom podem ser o que você quiser.

Tudo isso traz consigo um grande perigo presente na sociedade moderna: o racionalismo antiético. Por este motivo, no tempo atual, é possível ver temas saindo das universidades, como a defesa do infanticídio (leia: A macabra defesa do infanticídio) ou a busca por métodos de pesquisas que não respeitam a vida humana.

O moderno exige valores clássicos

Decerto, atualmente, temos uma educação e uma sociedade eticamente esquizofrênica, pois relativizarmos as virtudes com a educação moderna, mas continuamos a exigir os valores da educação clássica em nossas vidas. Lewis observou isso muito bem quando afirmou que 2200 anos de precedentes culturais e educacionais não podem desaparecer da noite para o dia. De alguma forma, na era moderna, a sociedade ainda espera pelas virtudes da era clássica. Tais como a honestidade, a coragem, a honra e a bondade. É como se houvesse uma memória cultural inconsciente permeando a nossa sociedade.

Veja as palavras de Lewis sobre essa dissonância educacional:

“E o tempo todo — tal é nossa situação tragicômica — continuamos a clamar por aquelas qualidades que nós mesmos impossibilitados de existirem. Você dificilmente abrirá um jornal sem encontrar a afirmação de que nossa civilização precisa mais é de “impulso”, ou dinamismo, ou abnegação, ou “criatividade”. Numa espécie de ingenuidade horrenda, removemos o órgão e exigimos dele sua função. Nós criamos homens sem peito e esperamos deles virtude e ímpeto. Ridicularizamos a honra e ficamos chocados quando encontramos traidores em nosso meio. Castramos e exigimos dos castrados que sejam fecundos.”

Lewis, C. S.. A abolição do homem (Clássicos C. S. Lewis) (p. 20). Thomas Nelson Brasil. Edição do Kindle.

Eis o que vivemos. Uma educação baseada no relativismo das virtudes e em verdades meramente cientificistas. Porém, ainda temos uma sociedade que anseia por virtudes e busca algumas verdades transcendentais. Por isso, entender o que acontece com a educação dos dias atuais depende da compreensão dessa mudança de paradigma educacional. Se você se sentiu instigado pela temática, este texto tem muito a contribuir.

Um pouco sobre Churchill

Winston Churchill nasceu em 1874, em plena era vitoriana. Churchill era descendente de uma família abastada, filho de John Churchill, o primeiro duque de Marlborough. Pelo lado materno, sua ascendência era completamente americana; o seu avô materno era Leonard Jerome, um bem sucedido corretor da bolsa de Nova Iorque e proprietário de jornais nos Estados Unidos. Mas, considerando toda história da sua infância, a sorte de Churchill se encerra na sua ascendência socioeconômica privilegiada, já que ele, definitivamente, não teve uma infância fácil.

Os problemas na infância de Churchill já começaram no seu nascimento. A mãe de Churchill, Lady Randolph Churchill, quando estava grávida de 7 meses, sofreu uma queda enquanto participava de um evento de caça no palácio de Blenheim. Tal acidente pode ter acelerado o nascimento de Churchill, que ocorreu poucos dias depois, de forma prematura.

Obviamente, as condições financeiras e os contatos privilegiados da família Churchill ajudaram o pequeno Winston a ter acesso a boas escolas e preceptores. Naquela época, a educação não era massificada como nos dias atuais. Sendo assim, geralmente, apenas as famílias mais ricas e influentes conseguiam acesso a uma educação de alto nível. Esse acesso faria toda diferença na vida de um menino com saúde frágil e, em certos momentos, com dificuldade de aprendizado. Isso mesmo, Churchill não nasceu um gênio e, para piorar, além dos problemas de saúde, ele teve muitos problemas de aprendizado durante a sua infância.

Ainda aos 2 anos de idade, por ocasião da nomeação do seu avô como vice-rei da Irlanda e do seu pai como secretário particular, o pequeno Winston foi morar com seus pais em Dublin, Irlanda. Já aos 4 anos de idade, durante um período político conturbado na Irlanda, Winston sofreu um acidente enquanto andava sobre o lombo de um burro, aos cuidados de sua ama, a sra. Everest, ocasionando uma concussão cerebral. Muitos anos depois, ele brinca sobre o caso dizendo: “essa foi a minha primeira apresentação à política irlandesa!”

Ainda muito jovem, na Irlanda, o pequeno Winston tinha uma preceptora que era responsável por ensiná-lo a ler e a fazer cálculos matemáticos. Essa era uma característica marcante da educação da época. As famílias participavam ativamente da educação dos filhos, seja por meio de preceptores ou pelos próprios pais.

Esse, sem dúvida, é um componente em falta na educação moderna. Hoje, grande parte das famílias ocidentais buscam terceirizar totalmente as suas responsabilidades, designando às escolas para educação cívica e socioemocional. Para piorar, na maioria das vezes, os pais sequer acompanham o desempenho dos filhos ou participam das decisões escolares como deveriam.

A importância da educação familiar

No caso do pequeno Winston, a educação domiciliar surtiu um grande efeito. Ele escreveu a sua primeira carta, para sua mãe, aos 7 anos de idade. Winston cultivava uma grande admiração por sua mãe desde muito cedo. Veja como Churchill a descrevia em suas próprias palavras, quando adulto:

“Para mim, [ela] era resplandecente como o planeta Vênus. Amei-a muito, mas a distância.”

Ele deixava claro o seu amor de filho para com sua mãe, mas também não deixava de mencionar a distância, pois os seus pais passavam a maior parte do tempo viajando ou morando longe dos filhos. Isso, claramente, causou um sofrimento profundo a Churchill, como vemos no trecho da primeira carta escrita por Winston, com data de postagem de janeiro de 1882:

“Minha querida mamãe, espero que esteja bem. Agradeço-lhe muito os bonitos presentes, os soldados, as bandeiras e o castelo, são tão bonitos, foi muito simpático da sua parte e da do papai, mando-lhe muitas saudades e muitos beijos do seu filho dedicado, Winston.”

Gilbert, Martin. Winston Churchill (pp. 15-16). Leya. Edição do Kindle.

Percebe-se que o pequeno Winston, em seus primeiros escritos, já demonstrava todo seu amor pelos pais, além de um profundo respeito. Esses eram valores familiares comuns para época. Normalmente, as crianças veneravam e respeitavam profundamente os seus pais. Ele finaliza a carta ressaltando que era um filho dedicado, demonstrando, mesmo sendo muito jovem, a sua preocupação em não decepcionar os seus pais.

Apesar de todo amor nutrido pelos seus pais, a maior parte do tempo, o pequeno Winston ficava na companhia da sra. Everest, com a qual ele encontrou o afeto que não podia ter da sua mãe, quase sempre distante. Veja o comentário de Churchill, sobre a sra. Everest, feito 50 anos depois:

“A sra. Everest tomava conta de mim e atendia todas as minhas necessidades. Era com ela que eu desabafava quando alguma coisa me perturbava.”

Aos 8 anos de idade, Winston foi enviado pelos pais para estudar no internato St. George, considerado uma instituição educacional rígida para os padrões da época. Provavelmente, a escolha por esse internato ocorreu devido ao seu jeito mais descontraído, pois ele era considerado, por alguns, um menino problemático. Isso deixou o pequeno Winston muito infeliz. Ele ficou inconformado com a ideia de se distanciar da sua casa, dos seus brinquedos e da sra. Everest.

Internato St. George

O internato St. George era severo e, com certeza, os seus métodos de ensino não seriam aceitos por nossa sociedade atual, já que a violência, frequentemente, fazia parte do processo de ensino. Dependendo do tipo de desobediência, as crianças podiam ser castigadas ao açoitamento com varas. Não era incomum as crianças receberem chibatadas por causa de delitos bobos, como não arrumar o quarto ou fazer bagunça. Eram punições duras e crueis. Obviamente, o pequeno Winston odiou aquela escola, como bem destacou:

“(…) e que vida angustiada eu tive durante mais de dois anos. Progredi muito pouco nas minhas lições e nada nos jogos. Contava os dias e as horas para o fim de cada período, quando voltaria para casa, deixando a detestável escravidão, e colocaria os soldados em linha de batalha no chão do quarto dos brinquedos”.

Gilbert, Martin. Winston Churchill (pp. 15-16). Leya. Edição do Kindle.

As palavras de Churchill denotam uma profunda insatisfação quanto ao período em que ele estudou na escola St. George. Isso só reforça a ideia de que a violência ou repressão exagerada não traz bons resultados educacionais. Sem mencionar as sequelas físicas e emocionais que este tipo de conduta pode causar na formação do indivíduo. A repressão exacerbada, castigos físicos e a violência em geral não gerou bons resultados educacionais para Churchill. Pois após o primeiro período na escola St. George, seus pais avaliaram que ele não melhorou quase nada e evoluiu muito pouco nas atividades escolares. Palavras da mãe de Churchill, em carta escrita para o marido, em 26 de dezembro de 1882:

“(…) Quanto aos progressos de Winston, lamento dizer, mas não vi nenhum. Talvez ainda não tenha passado tempo suficiente. Lê muito bem, mas isso é tudo, e, nos dois primeiros dias em que esteve em casa, falou em um linguajar rude e muito alto. Estou totalmente desiludida.”

Gilbert, Martin. Winston Churchill (pp. 15-16). Leya. Edição do Kindle.

O primeiro boletim do pequeno Winston foi medíocre. Ele ficou em último lugar, em uma turma de 11 alunos. Resumidamente, a infância de Churchill foi conturbada por diversos motivos: a distância dos pais, a dificuldade em se adaptar às escolas mais rígidas, os problemas de saúde que eram constantes e a extrema cobrança da família por resultados educacionais mais sólidos tornavam a vida do pequeno Winston um verdadeiro inferno.

O trunfo!

Mesmo com tantos desafios, o pequeno Winston tinha um trunfo que mudou sua trajetória de insucesso. O gosto refinado pela leitura. Tal gosto era fruto da educação familiar e escolar da época, que primava pela leitura, pelas artes e pela música clássica. Assim, o pequeno Winston teve contato com o que havia de melhor no mundo ocidental. Isso fez toda diferença em sua educação.

Aos 9 anos de idade, o pai lhe deu o livro A ilha do tesouro, de Robert Louis Stevenson. O pequeno Winston já era acostumado a ler livros considerados adiantados para sua idade. Seu boletim continuava ruim, mas ele não perdia o ímpeto pela leitura. Nesse aspecto, a escola não foi tão importante para Churchill. De certa forma, pode até ter o atrapalhado, pois a escola, provavelmente, não conseguia acompanhar seu destemor literário. Leia o que Churchill escreveu sobre esse período da sua vida escolar:

“Meus professores me consideravam ao mesmo tempo atrasado e precoce por ler livros que não eram para a minha idade e ainda assim ser o último aluno da classe. Ficavam ofendidos. Tinham largos recursos de persuasão à sua disposição, mas eu era teimoso.” Seu boletim escolar nesse verão também mostra que continuava a ter problemas de disciplina. Em empenho, comentou-se: “De maneira geral, razoável. Ocasionalmente, provoca grandes problemas.”

Gilbert, Martin. Winston Churchill (pp. 15-16). Leya. Edição do Kindle.

A escola St. George realmente não estava ajudando o pequeno Winston. Claramente, naquele período, a sua evolução escolar era resultante, única e exclusivamente, da sua estrutura familiar e dos seus próprios esforços pessoais.

Uma nova escola!

Ainda aos 9 anos de idade, no outono daquele ano, o pequeno Winston sofreu mais uma crise de saúde. O médico da família recomendou que ele passasse a estudar próximo ao litoral e indicou uma escola em Brighton. O ocorrido parece ter sido providencial, pois, na nova escola, o desempenho escolar do pequeno Winston começou a melhorar.

O currículo escolar da época era bem diferente do de hoje em dia. O pequeno Winston estudava Francês, Grego, Latim, Estudos Clássicos, Literatura Inglesa, Matemática, dentre outras coisas. Além disso, a prática de esportes era fortemente incentivada e o comportamento individual das crianças era constantemente avaliado. O foco do ensino estava no aprofundamento dos conhecimentos e não em adquirir um maior volume de informações. As crianças tinham contato com a literatura clássica muito cedo e o eruditismo (no melhor sentido da palavra) era muito valorizado na sociedade da época. Era um ambiente mais propício para se preparar homens de peito.

Adicionalmente, o pequeno Winston ainda tinha que estudar durante as férias. Não era incomum, por exemplo, sua mãe contratar preceptores, geralmente bastante disciplinadores, para dar suporte a Winston nas férias de verão. Havia pouco tempo para as brincadeiras de criança.

O tempo passou e a escola de Brighton facilitou a vida escolar do pequeno Winston. Ele evoluiu consideravelmente no período que estudou por lá, sempre com o acompanhamento de perto da família, principalmente da sua mãe, que mesmo estando longe, estava atenta a todos os passos do filho. Além disso, a sra. Everest, que era uma pessoa de extrema confiança da família Churchill, repassava todos os acontecimentos escolares para Lady Randolph Churchill.

Nova fase de estudos

Apesar das melhorias, o pequeno Winston não poderia ficar em Brighton para sempre. Portanto, para continuar seus estudos, ele tinha 2 opções: a escola de Winchester ou a de Harrow. A família optou por enviá-lo à Harrow. Considerando todo o histórico de saúde do pequeno Winston e o fato de quase ter morrido de pneumonia ainda aos 11 anos de idade, essa parecia a decisão mais acertada. A escola fica, até hoje, a noroeste de Londres no distrito de Harrow.

Winston ficou muito feliz, e um dos motivos era o fato do exame de admissão de Harrow não ser tão difícil quanto o de Winchester. Sim, as boas escolas da época tinham exames de admissão dificílimos. Para entrar em Harrow, com apenas 13 anos, Churchill teve que dar muito duro, estudando grego, latim, literatura e alguns tópicos de matemática. Começou a estudar Heródoto no original grego e Virgílio. Isso mesmo, aos 13 anos, ele lia livros clássicos em grego. A educação da época, com influência fortíssima da educação clássica, proporcionou a ele um eruditismo inimaginável para os padrões educacionais dos dias atuais.

Apesar de ter achado o exame muito difícil, principalmente a prova de latim, Winston conseguiu passar para Harrow. E, assim, iniciava-se a segunda fase escolar de Churchill. Seus estudos continuaram, cada dia com mais dedicação e afinco. Foi assim que Winston criou as bases educacionais que o transformariam em um dos homens mais importantes do século 20.

Apesar de viver um período de transição entre a era clássica e a era moderna, pode-se afirmar que Churchill foi forjado pelas bases pedagógicas do ensino clássico, principalmente no aspecto curricular. E isso fez toda diferença em sua vida.

Os resultados obtidos por Churchill

Antes de falar sobre alguns feitos de Winston Churchill, vale ressaltar que o objetivo deste artigo não é fazer um resumo biográfico ou criar um juízo de valor sobre a vida e a obra de Churchill. Nosso foco será a compreensão de como um modelo educacional, com grande influência da educação clássica, forjou a formação intelectual e moral de um dos homens mais importantes da história da humanidade. Agora, por conseguinte, vamos falar sobre algumas realizações de Churchill, correlacionando-as com a educação.

Winston foi um aluno mediano em toda sua vida escolar. É bem verdade que teve acesso às melhores escolas e preceptores. Mas, do ponto de vista educacional, muitos outros foram melhores do que Churchill, em sua época. O que marcou profundamente a sua educação foi a associação entre as bases sólidas de um currículo de educação clássica com o seu empenho pessoal, além de um sólido suporte familiar. Esse fato reforça a ideia de que a participação da família e o esforço pessoal são os grandes diferenciais da educação infantil. Dito isso, vamos destacar alguns feitos e habilidades de Churchill.

Habilidades e feitos de Churchill

O gosto pela leitura, sem dúvida, foi um divisor de águas. A qualidade dos livros lidos por Churchill fez toda diferença, pois ele bebeu direto da fonte do erudito, lendo os clássicos da literatura ainda muito jovem. Isso o ajudou a adquirir duas habilidades fundamentais: o domínio da retórica e da escrita.

O estudo de latim e de outras línguas lhe conferiu um senso de lógica extraordinário, além de contribuir para o domínio da retórica. Adicionalmente, o círculo de amigos e familiares ligados à política ajudaram Churchill a ter uma visão de mundo mais politizada. Isso pode ter reforçado a sua habilidade de retórica.

Com toda essa precocidade literária, Churchill começou a escrever muito cedo. Ainda em Harrow, ele já publicava cartas em um impresso escolar solicitando melhorias relacionadas ao funcionamento da escola. Mais tarde, já formado, Churchill participou e atuou como correspondente de guerra, chegando a ser prisioneiro de guerra em uma ocasião. Essa vivência lhe conferiu uma bagagem de experiências única, capacitando-o para escrever artigos brilhantes sobre as guerras. Tais artigos eram publicados em jornais da Inglaterra e dos Estados Unidos.

Por algum tempo, sua principal fonte de renda era por meio da publicação desses artigos em jornais importantes. A primeira obra de Churchill como escritor foi para uma série de cinco artigos sobre a Guerra de Independência Cubana no The Graphic, em 1895, o ano da morte do seu pai, Lorde Randolph.

O seu livro mais famoso foi A Segunda Guerra Mundial, um compêndio de seis volumes, que consumiu grande parte do seu tempo de produção literária. No total, Churchill escreveu cerca de 40 livros, dentre eles, um romance intitulado Savrola, sua única obra de ficção. Finalmente, em 1953, sua obra literária foi coroada com um prêmio Nobel de literatura.

Churchill e a consciência social

Outro ponto que merece destaque é a consciência social de Churchill. Sua vida política foi marcada pela defesa dos mais necessitados e desafortunados. Dentre as reformas sociais defendidas por Churchill estavam: reforma das prisões, pensão para viúvas e órfãos, arbitragem para disputas laborais e assistência do Estado para quem procurava emprego.

O fato de ter nascido em uma família abastada não tirou de Churchill o senso de responsabilidade. Sua família o ensinou, desde muito cedo, que os objetivos educacionais só podem ser alcançados com muita disciplina e dedicação. Além disso, seus problemas de saúde recorrentes, provavelmente, o tornaram um homem extremamente resiliente. Creio que tudo isso moldou o caráter de Churchill, tornando-o um homem capaz de assumir e gerenciar grandes responsabilidades em momentos críticos.

Essa característica pôde ser observada em seu comportamento durante a Segunda Guerra Mundial. Churchill, enquanto era primeiro ministro da Inglaterra, convenceu seu povo a resistir aos ataques nazistas e a não fazer um acordo de trégua com alemães, mesmo sabendo da superioridade militar alemã na época. Como todos sabem, isso mudou os rumos da Segunda Guerra Mundial.

Como se não bastassem todas as habilidades e realizações já citadas no presente texto, Churchill aprendeu a pilotar aviões, antes da Primeira Guerra Mundial. E, de forma visionária, em 1918,  fundou a Royal Air Force (RAF), a força aérea britânica, que foi fundamental para impedir a invasão nazista a Inglaterra, durante a Segunda Guerra. Além disso, ele foi pioneiro no desenvolvimento de tanques e de sistemas de defesa antiaérea.

Em suma, ao analisarmos uma história tão repleta de desafios e realizações, pode-se perceber claramente que a educação recebida por Churchill influenciou fortemente os rumos da sua vida pessoal e profissional, transformando o pequeno Winston, um garoto problemático e com problemas de saúde recorrentes, em um homem de muita fibra; capaz de influenciar gerações de pessoas em todo mundo, desenvolver inúmeras habilidades e de mudar os rumos da Segunda Guerra Mundial. Eis o poder da educação.

Foco da educação clássica

De uma maneira geral, o foco da educação clássica está em ensinar a escrever, falar, ler e pensar bem. Assim, o currículo escolar não pode se dispersar muito, pois é preciso aprofundar o conhecimento dos estudantes com ênfase no trivium (gramática, lógica e retórica) e no quadrivium (aritmética, geometria, música e astronomia). A ideia é centralizar o aprendizado da criança na aquisição de conhecimentos e habilidades que lhes darão a base necessária para que, de forma autônoma, possa adquirir todas as outras habilidades que, possivelmente, lhes serão solicitadas no futuro.

Foi mais ou menos isso que aconteceu com Churchill. Ele foi lapidado por um currículo clássico e um intenso acompanhamento familiar. O resultado prático disso foi a preparação para vida, e não apenas para o domínio técnico de determinados conhecimentos. Ele se tornou um homem intelectualmente autônomo, sendo capaz de pensar bem e de se expressar melhor ainda. O domínio da linguagem e da lógica o fez compreender que o mundo é permeado por diferentes fontes de conhecimento.

Obviamente, tal visão de mundo foi adquirida por meio de uma soma de fatores. Mas, para simplificar a minha linha de raciocínio, destaco 5 aspectos fundamentais acerca da educação recebida por Churchill, que deveriam servir de contraponto para educação moderna.

1. Participação da família na educação dos filhos

A educação de Churchill era centrada na família. Portanto, em grande parte, os seus resultados educacionais podem ser atribuídos ao suporte familiar que ele teve na infância (Leia: Educação “covidiana”: Hora de assumir a responsabilidade pela educação.). Ressalte-se que tal suporte familiar não foi restrito apenas a uma questão meramente financeira. Muito pelo contrário, sua família participou ativamente da vida escolar de Churchill, mesmo à distância.

Quando se trata de educação infantil, a família deve ser responsável pelo processo educacional das crianças. Pois, diferentemente dos adultos, as crianças ainda não desenvolveram suas capacidades cognitivas a ponto de serem autônomas e capazes de decidir, com responsabilidade, acerca dos seus próprios caminhos educacionais.

Infelizmente, a educação moderna e os costumes da sociedade contemporânea facilitaram a total terceirização da educação infantil. O peso das responsabilidades educacionais, que antes eram da família, foi colocado sobre os ombros das escolas. E a repercussão disso é uma formação moralmente frágil, meramente conteudística, pouco holística e baseada na relativização das virtudes. Na sociedade moderna, o último bastião das virtudes e valores clássicos ainda reside no seio das famílias.

2. Atribuição de responsabilidade

Churchill recebeu responsabilidades e atribuições muito cedo. Ele não demorou a perceber que, mesmo tendo nascido em uma família rica e influente, o seu sucesso profissional e pessoal dependeria mais do seu esforço individual do que de qualquer outra coisa. Assim, ele tomou as rédeas da sua vida e seguiu em frente. Por outro lado, sua família procurou dar o exemplo e agiu de forma rígida e disciplinar para que ele não desviasse do caminho da virtude.

Se compararmos com os costumes atuais, perceberemos que há uma aversão à atribuição de responsabilidades às crianças na educação moderna. Evidentemente, as responsabilidades devem ser proporcionais à idade da criança. Mas, será que não estamos errando na dose? Será que nossas crianças não estão se dispersando demais? É preciso refletir!

Aos 8 anos, o pequeno Winston já tinha um conjunto de responsabilidades educacionais e comportamentais muito bem definidas. Aos 13 anos ele já era um iniciado da literatura clássica e tinha uma base importante de conhecimento em grego e outras línguas.

Obviamente, Churchill recebeu o melhor da educação inglesa do século XIX. Por este motivo, alguns podem pensar que é injusto comparar uma educação de alto nível com a média educacional brasileira. Mas também há de se considerar que são mais de 100 anos de diferença. Em tese, o nível da educação média atual deveria ser muito mais alto do que a educação do século XIX.

Além disso, é preciso considerar os avanços tecnológicos do setor educacional, nesses últimos 100 anos. Eles permitem a gestão dos processos pedagógicos com muito mais eficiência e a produção de um volume muito maior de conteúdo de alta qualidade educacional. Mesmo assim, os filhos da educação moderna comumente apresentam deficiência de leitura, dificuldade de concentração, não assumem muitas responsabilidades e são moralmente voláteis.

3. O currículo

O currículo escolar de Churchill era baseado no ensino clássico ou artes liberais. Isto é, o foco do ensino não era trabalhar a superficialidade de um grande leque de conteúdos. Ao invés disso, o currículo era pensado para que o estudante adquirisse habilidades e competências mentais capazes de dar suporte ao aprendizado de qualquer coisa (Leia: Quer melhorar seus serviços educacionais? Invista em um bom currículo.). O currículo era baseado no trivium e no quadrivium.

O trivium consiste nas 3 primeiras artes liberais: gramática, retórica e dialética (ou lógica). Resumidamente, a ideia é fazer com que o estudante domine a linguagem, consiga estruturar seus pensamentos dentro de um arcabouço lógico e possa se expressar com desenvoltura. Geralmente, o trivium é aplicado nos primeiros anos escolares.

Já o quadrivium, baseia-se nas artes matemáticas: aritmética, música, geometria e astronomia. Em tese, o quadrivium complementa o trivium, reforçando a noção de lógica, o entendimento da natureza dos números e do universo.

Juntos, trivium e quadrivium são chamados de artes liberais. E, do ponto de vista do ensino clássico, o homem que não domina as artes liberais não pode ser livre. Exemplificando, o homem que não é capaz de dominar a arte da lógica não consegue estruturar seus pensamentos ou entender as ideias dos outros, tornando-se um ser isolado e facilmente manipulado por outras pessoas. Já a falta do domínio da retórica acarreta uma profunda dificuldade em se expressar e convencer as outras pessoas sobre suas próprias ideias. Enfim, o domínio de cada uma das sete artes liberais é fundamental para um homem que almeja ser livre.

Adicionalmente, é preciso compreender que o ensino clássico não se restringe apenas a um currículo, tampouco a alguma estratégia de ensino ou modelo didático. Trata-se de uma visão de mundo que se reflete em um modelo educacional. Por isso, o ensino clássico é atemporal e pode ser aplicado com sucesso, mesmo nos dias atuais.

4. A valorização do erudito

A relativização do significado da cultura, promovida pela educação moderna, nos trouxe um efeito colateral: a desvalorização do erudito. Quase tudo passou a ser considerado arte: um movimento político, um protesto, uma ideia sem sentido, um livro sem palavras, um canto desafinado, uma música sem ritmo dentre outras coisas passaram a ser consideradas como arte. A beleza e a arte foram ressignificadas pelo modernismo.

Nesse sentido, um dos maiores filósofos ingleses, Roger Scruton, talvez tenha sido o homem que melhor sintetizou o que aconteceu com a arte e com a beleza no mundo moderno. Em um dos seus textos, ele disse:

“Os modernistas surgiram porque artistas, escritores e músicos se ativeram à visão de beleza como uma presença redentora em nossas vidas. E essa é a diferença entre uma verdadeira obra de arte e a falsificação. Arte de verdade é uma obra do amor. Arte falsa é uma obra do engano.”

Fonte: Como identificar a arte de verdade?

Nesse contexto, nossas escolas abandonaram a literatura clássica, o estudo mais apurado da língua portuguesa e o rigor linguístico. Qualquer texto pode ser usado como base literária para nossos estudantes, em detrimento da literatura clássica e de obras verdadeiramente artísticas. Dessa forma, atualmente, autores como Machado de Assis e Carlos Drummond de Andrade são pouco conhecidos entre os mais jovens.

Enquanto Churchill lia, aos 13 anos de idade, Eneida, de Virgílio, os estudantes brasileiros da era moderna, em grande parte dos casos, na mesma idade, sequer conseguem entender o que estão lendo e ainda são orientados a ler textos vazios e sem alma (Leia: Os 6 pilares da alfabetização: A ciência que embasa a literacia).

5. Avaliação continuada

O pequeno Winston era avaliado a todo momento, sob vários aspectos: comportamental, disciplinar, desempenho acadêmico e virtudes; pelos pais e pela escola. Vale lembrar que, naquela época, não existiam as tecnologias de hoje e tudo era registrado no boletim, ou falado pessoalmente com a família. Mesmo assim, a família Churchill estava a par de todas as ocorrências escolares do pequeno Winston. Isso permitia intervenções pedagógicas e disciplinares rápidas e eficientes.

A avaliação escolar da época era focada em avaliar a evolução dos estudantes, bem como comparar os resultados entre os estudantes. Esse é outro ponto que a educação moderna deixa a desejar (Leia: Os pilares da avaliação de estudantes.).

Considerações finais

Em suma, Winston Churchill era um homem verdadeiramente livre, e essa liberdade plena foi proporcionada por sua educação. Ela instrumentalizou a sua liberdade, conferindo-lhe habilidades e competências que o tornaram um ser intelectualmente autônomo. Isto é, Churchill aprendeu a aprender ainda quando criança.

Essa é a essência da educação clássica: transformar as mentes humanas em máquinas de aprendizado autônomo. É preciso treinar nossas mentes para que elas sejam capazes de aprender sozinhas o tempo todo. Só assim conseguimos nos adaptar e suplantar os desafios impostos em nossas vidas. Essa capacidade é um bem intransferível que não pode ser roubado por outrem. Arrisco-me em afirmar que isso é a materialização da liberdade em estado bruto.

Quanto à educação moderna, limitarei-me a dizer que se trata de uma grande ilusão. Ela buscou tirar as virtudes do foco educacional subvertendo os conceitos de cultura e arte. Tudo isso para quebrar o paradigma do homem clássico em todas as suas dimensões, e trazendo consigo a ideia de que a única fonte de conhecimento deve vir por meio da ciência.

Por fim, eu apostaria no retorno da educação clássica às nossas salas de aula, nos próximos anos. Pois a sociedade moderna clama pela luz educacional das virtudes.

Até o próximo artigo!

No items found.